O que você acha que daria para criar com um rolo de papel higiênico e um filtro de café de papel? E com um cabide de madeira e rodinhas? Bom, o menino do nosso livro de hoje, dado a misturar objetos e ideias que aparentemente não têm nada a ver um com o outro, construiu um abajur branco e um cabide móvel!
Ele é O menino arteiro, da editora ÔZé, e tem sua história contada de um jeito delicioso pelo Gil Veloso, com obras do artista plástico Guto Lacaz como ilustração. Esse menino, desde pequeno, era um “artista verdadeiro”: “Estava sempre ocupado com coisas, troços, trecos e cacarecos, fazendo dos objetos gato-sapato, parecia possuído pelo bicho-carpinteiro”. Vivia desmontando as coisas para ver como funcionavam e remontava tudo de um jeito inesperado, buscando novas funções e novos sentidos para elas.
Sem conseguir ficar parado, movido por “ventos criativos”, o menino vivia fazendo arte e inventando moda. Engraçado que, sempre que alguém fala isso de uma criança, na hora a gente pensa que ela está fazendo alguma coisa que não devia, né? Ué, mas arte não é uma coisa boa? Nós achamos que sim!
Mas, como acontece com muitos artistas e arteiros mundo afora, o menino era incompreendido até pela própria família. Ele organiza uma exposição em casa para exibir suas obras, mas todo mundo fica chocado e acha que nada daquilo tem pé nem cabeça, utilidade e, muito menos, pode ser chamado de arte. Mal sabem eles que a arte é uma forma de expressão e que nem tudo na vida precisa ter uma finalidade prática e imediata, né?
O projeto gráfico do livro (quer dizer: o tamanho, o jeito como as imagens e o texto são distribuídos sobre as páginas, o uso de cores etc) também é do Guto Lacaz e parece brincar com o conceito dos museus de arte moderna e contemporânea – você já conheceu algum? Em geral, eles são bem amplos e abertos, têm uma arquitetura diferente e as paredes são brancas, para destacar as obras.
Além disso, as obras do livro trazem o eco dos readymades, obras criadas pelo artista francês Marcel Duchamp. Ele resgatava objetos cotidianos de uso prático que, tirados de seu contexto original – pronto! –, também passavam a ser considerados obras de arte. Isso foi na década de 1910 e causou um escândalo completo; como, aliás, quase tudo que os artistas de vanguarda (que questionavam o papel da arte na sociedade) faziam. Hoje, porém, as pessoas já se acostumaram e essas obras estão expostas em museus!
Parece que o Duchamp também foi um grande menino arteiro, né? Assim como o Guto Lacaz, criador das obras que ilustram o livro e possivelmente a inspiração para ele. Afinal, o narrador conta que o menino é “arguto e loquaz”, além de “astuto e capaz” – parece clara a brincadeira com os sons, não?
Até semana que vem, pessoal!