O texto dessa semana é ligeiramente diferente dos anteriores: o livro escolhido foi “Os Irmãos Karamázov”, de Fiódor Dostoiévski. A obra pode mudar as perspectivas do leitor no meio social, pois aborda diversas questões filosóficas que são importantes o suficiente para serem pensadas pelo menos uma vez na vida. Questões como o problema do mal e o sofrimento humano, a liberdade, a moral, a busca pelo sentido da vida, a religião e a fé, o livre arbítrio e a razão conflitando com a emoção, são temas importantes para o convívio em sociedade. As ilustrações do texto, ficam por conta do pintor Ulysses Boscolo e foram as escolhidas pela Editora 34 para ilustrar também o livro, feitas em nanquim em bico de pena de bambu e aguada sobre papel.
"Em 'Os Irmãos Karamázov', considerado por muitos sua obra-prima, Dostoiévski conduz o leitor em uma viagem pelos recantos mais sombrios e mais luminosos da alma humana, com passagens inesquecíveis - como a parábola do Grande Inquisidor e os questionamentos radicais de Ivan Karamázov sobre a moral e o livre-arbítrio - que marcaram decisivamente não só a literatura, mas a própria história do pensamento ocidental."
Casos de família: conheça os três irmãos Karamázov
O livro tem três personagens principais. Aliócha Karamázov, é o mais novo dos irmãos e o mais inclinado à vida espiritual, seu personagem representa a bondade, o altruísmo e a fé inabalável. Ele foi discípulo de Stárets Zósima, um padre sábio e querido pela comunidade e sua morte causa grande impacto na vida de Aliócha, levando-o a uma crise de fé, no entanto, ele vivencia uma visão poderosa de seu antigo mestre e este acontecimento renova sua fé e fortalece sua determinação de levar uma vida centrada no amor e compaixão. O irmão cresce como símbolo de bondade e assume a responsabilidade de ajudar o próximo.
Ivan Karamázov, o irmão do meio, é o intelectual e racional dos três é marcado por questionar dogmas religiosos e morais. Acaba simbolizando a dúvida e o dilema existencial do ser humano, que sempre busca sentido num mundo caótico, seu ceticismo é abordado pela famosa “Parábola do grande Inquisidor”. O conflito de Ivan se inicia após descobrir que suas ideias influenciaram Smerdiákov, o empregado da casa, a cometer um crime contra o Fiódor Karamázov, pai dos três. Após esse acontecimento, Ivan é atormentado pela culpa e entra em estado de loucura, em conflito entre sua lógica e emoção.
Já Dmitri Karamázov, o irmão mais velho é emocionalmente impulsivo e guiado pelos seus desejos e paixões. Ele representa a força da natureza humana sem regras. Ele tem um temperamento impulsivo e seu conflito se desenrola ao perceber que ele e seu pai disputam o amor da mesma mulher, Grushenka, uma mulher descrita como linda e independente. Além de impulsivo, Dmitri sempre luta contra os seus instintos e sua consciência, refletindo a dicotomia humana. Ao longo do enredo, ele é confrontado pelas suas escolhas impulsivas e se sente na necessidade de assumir responsabilidade pelas suas escolhas. Dmitri também é acusado pelo assassinato de seu pai, Fiódor.
Os três irmãos representam juntos os diversos aspectos da vida humana: a fé, a razão e a paixão, cada um com seus próprios conflitos e questões sobre moralidade, liberdade e propósito de vida.
A Magnum Opus de Dostoiévski
O último livro de Dostoiévski, “Os irmãos Karamázov", é considerado a obra prima do autor e recebeu um elogio até de Sigmund Freud, que afirmou ser este o maior romance já escrito.
O enredo se inclina sobre o relacionamento complexo da família Karamázov, principalmente no convívio conturbado de Fiódor e Dmitri. Toda obra se passa numa cidade hipotética da Rússia e é narrada por um narrador onisciente, mais ou menos três décadas depois dos ocorridos descritos no livro.
O patriarca da família, Fiódor Pávlovitch Karamázov, um homem notoriamente libertino, que ascendeu socialmente graças aos dotes que recebeu de suas duas esposas, que vieram a falecer prematuramente. Ele vive uma vida de excessos sustentada por negociatas (alguém que tem um negócio lucrativo, porém suspeito). Fiódor não era um bom pai e acabou terceirizando a criação de seus filhos a parentes, criados e à uma comunidade monástica, e ainda cuidou de subtrair um valor consideravelmente grande da herança de seu primeiro filho, fruto do primeiro casamento.
As crianças desenvolveram-se com personalidades distintas e como se isso não bastasse, a rivalidade destrutiva de Fiódor e Dmitri torna-se o foco central da família, e do livro. A disputa pelo coração de Grushenka ganha um elemento incendiário pelo ressentimento antigo de Dmitri para com o pai, pelo fato dele ter se apossado de parte da herança de Dmitri e por ameaçar não o restituir.
A obra revela sua força no campo da leitura psicológica, analisando os mínimos detalhes, ainda assim evitando pormenores excessivos que deixam o livro cansativo, muito pelo contrário, Dostoiévski te faz querer mais e mais detalhes sobre cada fato narrado. Ao decorrer da obra, fica claro que ela não ficará presa à narrativa psicológica, a história toma um tom histórico e filosófico, ao descrever, por exemplo a vida no mosteiro e o cerne da doutrina de uma das personalidades mais forte neste âmbito do livro: o religioso Stárets Zósima.
Além do enredo psicológico e da narrativa histórico filosófica, Dostoiévski permeia mais um gênero da narrativa, causando surpresa aos leitores, a rota dos acontecimentos do livro segue para uma trama de investigação policial, (percebe-se que o autor tem uma queda por narrativas criminais, já que seu outro livro célebre: Crime e castigo, segue esse mesmo ritmo) seguida por uma no tribunal, com exposições bem elaboradas, ricas, coesas e concisamente brilhantes, tanto por parte da defesa, quanto por parte da acusação.
Antes de finalizar, vale ressaltar a capacidade admirável de Dostoievski ao conceder personalidades tão ricas e distintas aos seus personagens. Mesmo não tendo tantas descrições físicas, ele consegue introduzir na mente do leitor traços, estilos marcantes e detalhes, com suas análises precisamente eficientes e detalhadas sobre a natureza de cada um. Logo que um personagem é citado, fica fácil vir à cabeça um retrato mental da personagem citada.
É uma leitura que tem a capacidade de te fazer rir, por conta dos costumes inusitados da época, gera também compaixão de determinados personagens, pois expõem tramas de temáticas universais, que surpreende pelo movimentos bruscos de roteiro e por argumentações bem fundamentadas e pelos personagens que são tanto peculiares, quanto reconhecíveis ao público.
Quem foi Fiódor Dostoiévski?
Dostoiévski nasceu em 1821, em Moscou e é considerado um dos principais escritores do mundo. Seu primeiro sucesso foi o romance Gente Pobre (1846), que já mostrava seu talento para explorar a vida emocional de seus personagens. Em 1849, foi preso por envolvimento em atividades políticas “agitadoras” e foi condenado à morte. Essa pena foi revertida e ele acabou passando quatro anos em um campo de escravidão na Sibéria, experiência que influenciou suas visões e futuros livros.
Após seu retorno, Dostoiévski produziu obras como “Crime e Castigo” (1866), em que aborda temas de culpa e redenção, “O Idiota” (1869), que aborda a ingenuidade e a bondade em um mundo imperfeito, e “Os Irmãos Karamázov” (1880). Sua obra tem influenciado pensadores, filósofos e escritores em todo o mundo e permanece relevante por seu exame complexo da psicologia humana.
Parabéns pelo texto! Deixei para ler “Os irmãos Karamázov" mais tarde e acho que o mais tarde chegou.
Curiosa para ler o livro! Irei agora mesmo!
Muito obrigada por compartilhar as percepções sobre a obra!
Gostei muito da descrição do livro vou ler.